segunda-feira, 25 de julho de 2011

a cor da terra


Às vezes encontramos o nosso âmago no meio das palavras que se cantam como se fossem profundos regos coloridos de terra. Imaginamos esse campo duro, agreste e sem fecundidade! E no meio de tanta incerteza, vemos a nossa cara, como se estivéssemos na frente de um espelho.
Será que os homens, na simplicidade das suas palavras, algum dia imaginaram que estavam a semear uma imensa poesia para nascer da terra. Como se fosse aquela seara esculpida por espigas maduras, a adivinhar o futuro!
Que terra é esta tão extensa, para onde olhamos sem alcançar a raiz do desejo. Uma terra onde nunca encontramos o fim! Onde parece pairar a eternidade que jamais alcançaremos.
Nestas pradarias voluptuosas, o canto triste dos pássaros começa a esvair-se e o Sol inclemente reclama a limpidez da água. Por aqui, nestes campos tão singelos e misteriosamente sensuais, entregamo-nos à expectativa e à esperança.
Já cortámos o fruto, vamos despir o chão e, depois, seguiremos para um ritual de concepção sem palavras. Essas, aos olhos do poeta, estão gastas! Escondidas nas pequenas brechas da nossa imaginação ou no segredo inútil de todas as estrelas que desaparecem quando a aurora nos beija os olhos.

espreitar... e ler!


dediquem lá um bocadinho do vosso precioso tempo a esta "30 DIAS" que já vai no nº 24 e apresenta nesta edição temas muito interessantes sobre o Baixo Alentejo.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

sabor a fel


A exemplo do que sucedeu com o Bloco de Esquerda e o PCP, também o Partido Socialista sofreu um fortíssimo revés nas últimas eleições – no país e no distrito de Beja! Bem pode Luís Pita Ameixa alegar que o PS ganhou na região, ao contrário do que sucedeu em muitos distritos, apenas porque teve mais votos do que os restantes competidores. É uma vitória, concordamos, mas deve ter um insuportável sabor a fel!
Político experiente e com muitos anos de liderança partidária, Ameixa sabe muito bem que, no distrito de Beja,  o seu partido teve o pior resultado desde 1995, perdeu milhares de votos e passou a ter apenas um deputado. Não é coisa pouca!
Não se julgue, contudo, que a responsabilidade cabe apenas a Pita Ameixa. Mas é ele o rosto principal daquilo que aconteceu: se o foi para as vitórias também tem de o ser para este crescente declínio! Assim, parece claro que a liderança do PS do Baixo Alentejo está a precisar de mudança.
É muito óbvio que os socialistas têm de abrir desde já uma reflexão capaz, atempada e sem precipitações sobre o seu futuro interno. Esse processo obriga ao envolvimento de uma nova geração de militantes que, necessariamente, terá de começar a dar a cara e querer assumir responsabilidades.  Seja no plano dos autarcas ou noutros sectores, parece esgotado o tempo para a táctica e para o calculismo! Também no Baixo Alentejo o PS precisa de um ciclo novo, que assente numa renovada influência social; no reforço de uma voz própria mais respeitada e ouvida no quadro do país; no aperfeiçoamento da sua capacidade organizativa, de militância e de mobilização. Não perceber isto é permitir tacitamente que se acentue a actual  linha de declínio!

quinta-feira, 9 de junho de 2011

a esquerda tem o que merece


Esqueçamos aquela moção de censura patética que o Bloco de Esquerda decidiu apresentar logo após a tomada de posse do Presidente da República! Foquemos a nossa atenção apenas nessa voluntariosa votação contra o PEC 4, inteiramente subscrita pelo mesmo Bloco de Esquerda e pelo PCP!
Esse foi o ponto de partida que levou à queda do Governo e abriu o caminho para a chegada da direita ao poder. Pelo meio, o PS teve um resultado desastroso e Sócrates despediu-se. O PCP perdeu votos mas resistiu e até cresceu na Assembleia da República. E o Bloco, sempre tão voluntarista e incoerente (andou ao lado do PS a apoiar Manuel Alegre, lembram-se?) sofreu um golpe muito contundente, ao ponto de muitos vaticinarem o princípio do seu fim!
Em resumo, a esquerda pode agradecer ao Bloco... de Esquerda, boa parte do descalabro sofrido nas eleições de 5 de Junho e o horizonte muito negro que tem pela frente. A esquerda, afinal, pode queixar-se de si própria e da sua idiossincrasia autofágica, sempre incapaz de dialogar, estender pontes e construir soluções. Tem o que merece!
Em sentido contrário, ainda os resultados não eram conhecidos, já os líderes da direita, como sempre fizeram desde 1974, liam nas estrelas um entendimento parlamentar e de governação. Com franqueza, se à luz desta “lua-de-mel” há quem acredite em dias fáceis, é bom que tire o “cavalinho da chuva”.
Quem manda é o FMI e o que aí vem já estava definido antes das eleições! Mas é justo conceder um prazo de confiança ao futuro Governo. Sem grandes expectativas, é certo! Mas crédulos de que haverá responsabilidade e compromisso. E que os interesses do país serão postos à frente dos oportunismos partidários e corporativos.

domingo, 29 de maio de 2011

mértola fantástica


No momento em que estamos mergulhados na mais profunda depressão social, contrafeitos pelos números dolorosos da crise e à espera das medidas anunciadas pelo FMI, bem precisamos de aliviar o vendaval de coisas más e enaltecer os bons exemplos.
Um desses momentos de remédio e alegria é Mértola e o seu extraordinário Festival Islâmico que, no último fim-de-semana, chamou àquela vila milhares e milhares de visitantes, que encheram por completo as ruas apertadas da zona velha, embalados pelo colorido de cada banca, de cada essência e de cada memória relevada pelos trajes e pela simpatia dos magrebinos com a tez esculpida pelo Sol do Mediterrâneo.
Compreende-se bem porque há tanta gente a seguir para aquele encontro tão ancestral. Só ali, na Mértola árabe que esconde eternos segredos nas calçadas das ruas estreitas e na cal branca das paredes, seria possível abrir as portas para um verdadeiro caleidoscópio mouro. Um quadro repleto de vida, animado pelo sangue que tem sabido correr em sucessivas gerações, nestes 13 séculos de memórias e sinais.
O Festival Islâmico de Mértola é o mais assinalável evento cultural da nossa região porque, em feliz harmonia, soube conjugar o encanto de uma vila que é a verdadeira varanda do Guadiana e acolhe no seu ventre sucessivas civilizações. Feliz a terra que tem gente a perceber esse carácter e conta com uma câmara municipal que concentra energias positivas em torno de um acontecimento tão notável. Durante todo o ano, Mértola já é um lugar fantástico e magnético. Durante estes dias do festival, multiplica esse condão e age como um íman a que é difícil resistir. Ainda bem para todos nós!

sexta-feira, 29 de abril de 2011

oportunismo efémero



Escrevi isto há um mês:

Em 2005, uma ministra da Educação chamada Maria de Lurdes Rodrigues encetou uma corajosa reforma no sector: a data de início do ano lectivo e a colocação de professores deixaram de ser anedóticas; surgiram aulas de Inglês em todas as escolas a partir do 1º ano; foram criadas condições para a extensão de horário com diferentes actividades até às cinco e meia da tarde; há aulas de substituição, refeições adequadas e obrigatoriedade no ensino até aos 18 anos (12º ano); a oferta formativa fortaleceu-se bastante na área profissional.
Entre estas e outras mudanças, a ministra também decidiu premiar os melhores professores pelo seu mérito. Para isso, estabeleceu um quadro de avaliação onde os mais competentes e empenhados passavam a ganhar mais e ser distinguidos.
Como Portugal é um país de direitos conquitados e inabaláveis, é sempre um drama fazer um confronto corajoso com movimentos corporativos, que se ancoram em sindicatos detentores de uma agenda que mais parece partidária do que dos trabalhadores. Mas, com alguns retoques, a reforma da ministra Maria de Lurdes Rodrigues conseguiu vingar e fazer o seu caminho.
Infelizmente, na passada semana, num completo clima de eleitoralismo e demagogia, PSD, CDS, PCP e Bloco de Esquerda  aprovaram a revogação desse projecto no Parlamento e deitaram por terra o trabalho feito nos últimos anos. Daqui para a frente, a avaliação dos professores continuará a ser o que sempre foi: todos serão muito bons ou excelentes!
Num país destes, onde os corporativismos são temperados com oportunismo eleitoral e político, em detrimento da responsabilidade e do sentido público, nada mais há a fazer. Sigamos alegremente pelo túnel escuro sem saída possível!


Felizmente, primeiro o Presidente da República e, há bocadinho, o Tribunal Constitucional, escreveram direito por linhas tortas. Os professores serão avaliados, como muitas outras classes profissionais! Os derrotados? Quem insiste na irresponsabilidade pelo puro oportunismo político!

desilusão

Como é fácil compreender a profunda desilusão que se apoderou dos apoiantes da candidatura de Fernando Nobre à Presidência da República. Em apenas três meses, o notável cidadão que difundiu pelo mundo uma organização humanitária que todos admiram, transformou-se em persona non grata e submetida aos “jogos da política”.
Fernando Nobre apregoou-se como um homem independente, distante dos partidos e capaz de liderar um crescente movimento cívico. Com essa pose, assegurou uma boa votação, que lhe garantiu um lugar ainda mais influente na sociedade portuguesa. Muitos vaticinaram que, daqui a cinco anos, com trabalho e sensatez, Nobre seria um fortíssimo candidato presidencial, onde poderia rever-se a sociedade cansada dos políticos e da política.
Eis senão que, num curtíssimo espaço de tempo, Nobre deixou-se levar para uma espiral de contradições. Bastou acenarem-lhe de dentro do PSD com um lugar na Assembleia da República, porventura no alto cadeirão da presidência. O médico da AMI, que tantos convenceu com as suas virtudes nada infectadas pelos partidos, depressa aceitou a proposta. E decidiu dar entrevistas, um pouco descaradas e ausentes de pudor, como só os piores da política costumam apresentar.
Fernando Nobre talvez ainda seja o cidadão respeitado pela sua imensa actividade pública e humanitária pelos quatro cantos do mundo. Mas, à luz do seu indescritível procedimento, jamais será um político respeitado, nem entre os seus pares nem entre os cidadãos. Isso é uma pena, porque não só estragou uma parte significativa da sua imagem, como deu um contributo determinante para violentar qualquer movimento cívico e da cidadania que surja em Portugal no futuro. É muito mau em tão pouco tempo!

terça-feira, 19 de abril de 2011

o primeiro voo














Assistimos, na última quarta-feira, 13, ao voo inaugural do aeroporto de Beja. Sejamos claros: aquele voo é extraordinário e está fora daquilo que seria lógico na abertura de um aeroporto. Mas tem um importante significado! Em primeiro lugar, revela uma ousadia do presidente da Câmara de Ferreira do Alentejo que merece ser elogiada. Com esta iniciativa, a Câmara de Ferreira conseguiu demonstrar que não estamos perante um sonho: o aeroporto está ali, pronto para que a região consiga tirar partido do seu potencial!
Admitamos, contudo, que isso carece do empenho e da força políticas para seguir em frente. Sendo assim, importa deixar aqui um voto de confiança para a ANA. Estamos absolutamente certos que esta empresa pública não está no processo apenas para cumprir uma determinação governamental. Pelo que se tem sabido, a ANA está a lidar com este processo de modo competente, sério e responsável. E precisa de tempo!
Não tenhamos ilusões: a abertura de um aeroporto, sobretudo se falamos do aeroporto de Beja, que é muito específico e está situado no interior do país, carece de uma trabalho muito apurado, inteligente e nem sempre fácil. Poderão alguns julgar que a abertura de uma infra-estrutura destas é quase como estalar os dedos. Não é! Sobretudo se o projecto é em Beja, no interior do país, numa pista militar e num tempo de “vacas magras”.
Perante tudo isto, inaugurar o aeroporto ainda continua a ser um caminho exigente e árduo. Um desafio que carece da melhor inteligência e pertinácia, mas também de um apoio político sério. Estamos certos que esse caminho já não tem retorno e que, como ficou bem provado na quarta-feira, dia 13, um futuro mais próspero para a nossa terra passa seguramente pelo aeroporto de Beja. Assim tivéssemos outras certezas!

o congresso

O Partido Socialista reúne este fim-de-semana em Congresso Nacional para consagrar Sócrates como secretário-geral e, obviamente, focar o alinhamento dos discursos e respectivas conclusões no acto eleitoral precipitado e algo irresponsável que a oposição decidiu antecipar para o pior momento.
Com seis anos de governação, os socialistas estão a “carregar” uma factura pesada que chega do exterior, fruto de um contágio indesmentível que já dilacerou a Grécia e a Irlanda (era um país exemplar, lembram-se?). Ignorar isto é ser pouco sério, mas, evidentemente, não reconhecer que o Governo errou nalguns pontos da sua estratégia também é pouco acertado.
Sendo assim, aquilo que será desejável para os socialistas neste momento é, sem dúvida, impedir que a reunião de Matosinhos seja uma submissão à urgência eleitoral e sem condições ao líder. Isto é, os socialistas têm de ser capazes de pôr o dedo nalgumas feridas, questionar opções da governação e impulsionar Sócrates para uma linha de acção mais coerente e realista.
Ninguém pense que o congresso servirá para “lavar roupa suja” ou pôr em causa a liderança. Estão errados aqueles que prevêem uma insurreição contra Sócrates. Como se notou no resultado quase unânime da eleição, a unidade não está em causa: mas isso não pode fechar a porta ao aprofundamento do debate. E o PS precisa de reflectir com ponderação e discutir com frontalidade e auto-crítica.
Agir desse modo permitirá dar um primeiro e decisivo contributo para Portugal sair desta borrasca em que está mergulhado. Sendo o partido da democracia e da liberdade, o PS também tem de ser capaz de ser, em quaisquer circunstâncias que as eleições ditarem, o partido da responsabilidade.

editorial do "Correio Alentejo" publicado a 01 Abril

segunda-feira, 21 de março de 2011

venham mais cinco!



Cinco anos na vida de um jornal que nasceu em Beja são quase uma eternidade! Olhamos para a história e concluímos que, nesta região do Baixo Alentejo, a vida não tem sido fácil para projectos de imprensa novos, nascidos do zero e sujeitos a todos os riscos de uma terra com economia muito frágil, poucas pessoas e algumas compreensões menos justas.
Neste primeiro parágrafo está resumido o percurso do “Correio Alentejo”. São conhecidas as razões que levaram ao seu surgimento e os diferentes percalços que teve de enfrentar. Mas… cá estamos, prontos para mais cinco anos e outros tantos desafios, com dias difíceis, boas e más notícias. E gente entusiasmada que nos incita em todos os momentos.
Estamos prontos e coesos para prosseguir uma missão que, perdoem-nos hoje a imodéstia, abriu caminhos na imprensa regional, inovando, criando novas formas de trabalhar e abordar a actualidade, arriscando em temas pouco usuais na nossa imprensa, com novas soluções para conteúdos e na área comercial.
Em 251 números do “CA” há muitos erros e coisas mal feitas! Mas acreditamos que também há muito empenho e muitas (boas) provas dadas. De diferença, criatividade, identidade e alguma ousadia!
Ficamos contentes por compreendermos que, nesta fase, títulos históricos e muito respeitáveis, não negam que o “CA” pode ser fonte de inspiração. Isso é bom! Podemos ser concorrentes, mas seremos mais fortes e ajudaremos melhor a nossa terra se formos frontais e leais!
Nesta casa nunca tivemos pudor com a adjectivação! E há termos que não deixamos cair em saco-roto ou que desrespeitamos quando é oportuno. O “CA” tem uma personalidade própria, assumida, muito alentejana e com raízes na terra. Aqui não negamos princípios ideológicos nem nos refugiamos em falsas independências! Mas há valores básicos da deontologia jornalística de que nunca prescindiremos: notícia é notícia; opinião é opinião!
O fortalecimento que agora se concretiza na área de opinião do jornal, com uma pluralidade inegável e ainda mais ampliada, é, aliás, uma prova acrescida da liberdade que o “Correio Alentejo” continua a assumir. Um sinal de vigor e nova determinação, numa sociedade onde é preciso cimentar a tolerância e pô-la de mãos dadas com a diversidade social e ideológica.
Esse é o nosso caminho. Com respeito pela nossa curta história mas confiantes que é possível prosseguir um trabalho inovador, com capacidade para fortalecer os conteúdos editoriais, dinamizar com criatividade a área comercial (sem ela, que seria de nós!) e fazer uma aposta mais consistente nas plataformas digitais, seguramente com uma remodelação completa do sítio www.correioalentejo.com
Há outras ideias que já estão em marcha e que teremos oportunidade de anunciar gradualmente. Propostas que estão a ser amadurecidas e que irão ajudar-nos a consolidar ainda mais o único projecto de iniciativa totalmente privada da imprensa regional.
Um projecto que nada seria sem a forte relação estabelecida com os nossos assinantes e leitores, que cada vez são mais! E com os clientes fiéis e interessados (autarquias locais, empresas e empresários da região!) que fazem do “CA” um parceiro de negócios. Finalmente, não podemos deixar de destacar o trabalho feito por uma pequena equipa (cinco profissionais em permanência e mais quatro colaboradores) que, desde a primeira hora, assumiu este desafio com coesão e soube “vestir a camisola”.
A todos muito obrigado. E venham mais cinco!

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

dia 4, sexta-feira, nas bancas

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

londres: 22 de maio



O operador turístico britânico Sunvil vai realizar 22 voos "charter" entre o principal aeroporto de Londres e o de Beja entre Maio e outubro deste ano, "assentes numa programação variada" no Alentejo, foi hoje anunciado. Os 22 voos entre os aeroportos de Heathrow e de Beja vão realizar-se aos domingos, entre 22 de Maio e 16 de outubro, através de um avião Embraer 145 de 49 lugares, precisa a ANA - Aeroportos de Portugal.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

já nas bancas

exigência e pluralidade



O presidente da Câmara da Vidigueira teve esta semana uma expressão certeira sobre o persistente embaraço que a nossa sociedade tem em lidar com os cidadãos de etnia cigana. Afirma Manuel Narra, e nós concordamos inteiramente, que, na Vidigueira como noutro concelho qualquer, “não há ciganos nem minorias étnicas, só há portugueses e todos têm os mesmos direitos e deveres”.
Sendo uma afirmação correcta e responsável, a verdade é que, no Alentejo e no resto do país, as coisas não são assim tão simples. Os hábitos pouco regrados e o espírito insurrecto da etnia cigana suscitam, não poucas vezes, implicações negativas e nada aceitáveis. É usual encontrar uma permanente exigência de direitos mas, no que diz respeito aos deveres, o povo cigano não costuma estar tão disponível.
Esse é o ponto de toda a divergência. Os ciganos só conseguirão obter o respeito geral e uma integração plena na sociedade se agirem com responsabilidade e sentido cívico. E se forem capazes de cumprir os deveres gerais que são exigidos a todos.
Claro que, noutros sectores da sociedade, não é raro encontrar cidadãos que também atropelam as regras mais elementares de civismo. E muitas vezes são aqueles que mais exigem aos outros! Não sendo esse um pormenor com pouco relevo, o que importa neste caso é reforçar a ideia expressa por Manuel Narra. Quem quer respeito deve dar-se ao respeito. Quem quer direitos tem de cumprir deveres. Quem exige respostas sociais não pode atropelar as regras instituídas na vida em sociedade.
Em síntese: a pluralidade dos povos e a riqueza dos seus hábitos culturais são bens inatacáveis que devem ser preservados e valorizados. Mas as normas elementares de convivência social e democrática também têm que ser respeitadas. E é bom ver esta questão tão delicada com os dois olhos bem abertos e com inteira racionalidade.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

um homem livre



António Inverno é um homem muito simples. Muito culto. António Inverno é um alentejano de Monsaraz, que cresceu na Lisboa dos artistas, da PIDE e da vida boémia. Uma Lisboa onde se cansou de estar e que trocou por amor ao Alentejo.
Tem 66 anos e assume-se como “um homem livre”. Um homem profundamente apaixonado pelo pequeno filho de oito anos que, lê-se nos seus olhos muito abertos e marejados, é o grande desafio para o resto da sua vida.
“É com as artes que farei o meu filho um homem. Se calhar fui mau pai para o primeiro, porque nunca atravessei uma rua para lhe comprar um brinquedo. A este sou capaz de correr o mundo para lhe comprar um lápis.”
Mestre António em estado puro. Cristalino. Uma figura que se entremeia entre os silêncios sentidos, as memórias dolorosas, a vida cheia de luz e muito divertida.
Um pintor fulgurante, que calejou as saudades do Alentejo nas ruas da velha Lisboa. Traçando risco que, dizem, reflectem “a herança da utopia e do sonho do Alentejo”. O que é isto, António? “Procuro inventar o mundo onde gostava de viver, com aqueles traços e aquelas formas. O Alentejo era um sonho…”
Era! Pelos visto, para António Inverno, já não é. Não se sente maltratado ou atraiçoado. Mas sente falta da solidariedade de outrora. Da honestidade, do aperto de mão, do valor da palavra e da franqueza. Tudo parece ter mudado no Alentejo: “Encontro coisas que eu dizia que não minha terra nunca iriam acontecer… mas estão aí! Estão aí.”
No meio deste novelo de desassossegos, o pintor que encantou a Lisboa do Chiado e abriu caminho à serigrafia em Portugal, sente-se desperdiçado. Confessa-se “a empatar e a queimar o tempo”! “Não me fui embora porque tenho cá uma criança com oito anos de que gosto muito. Tenho aqui o meu querido filho, se não já tinha ido embora!”

DITADURA E LIBERDADE
Cercados pela dura mão de Salazar, em meados de Sessenta os portugueses estavam amordaçados. Também as artes estavam cercadas. A PIDE controlava a criatividade com dolorosas e implacáveis grilhetas.
Inconformado, António Inverno deu asas à serigrafia em Portugal e encheu as telas de motivos a reflectir inconformismo. Palavras de ordem a inundarem a vida, as ruas e as casas de cada um. “A serigrafia é o telegrama mais rápido do artista. Eu faço uma e multiplico-a em 200 exemplares, que vão para a casa das pessoas.”
António Inverno torna-se conhecido, convive com os grandes nomes e ganha muito dinheiro. Podia ser hoje um homem muito rico! Não é. Essas fortunas deram-lhe campo para a generosidade. Tantas vezes para sacrifícios em nome de um gesto solidário.
“ Ajudei muita gente! Houve pessoas que estudaram e formaram-se e foi o António Inverno que pagou. Ninguém me obrigou ou pediu. Mas fiz isso. Cheguei a proteger filhos de prostitutas, que morriam. Isso custa muito dinheiro. Eu também preciso de comprar bifes... mas nunca liguei ao dinheiro!”


Uma frase para reflectir
“Sempre fui um homem de esquerda. Dos valores da esquerda. Mas, infelizmente, existe muita falta de diálogo na esquerda. É na esquerda que estão os homens com os tiques de Salazar. É na esquerda, não é na direita!”

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

inconformismo



O movimento lançado pela Associação de Defesa do Património de Beja, para contestar o fim dos comboios Intercidades directos entre Beja e Lisboa, é uma luta muito justa, oportuna e surpreendente.
Justa porque, como tem sido amplamente afirmado, é inaceitável que uma capital de distrito deixe de ter ligações directas à capital do país. Agindo assim, a CP está a secundarizar Beja, a piorar um serviço que nos habituámos a ter há décadas e, por esta via, a desconsiderar os baixo-alentejanos.
Infelizmente, ao longo de muitos anos, e provavelmente em muitos momentos que se seguirão, a sociedade civil da nossa região nunca conseguiu emergir de uma mera contemplação ao mal que lhe foram fazendo. Beja tem perdido tudo e, mesmo com esforços de reorganização administrativa, é uma cidade secundária e submissa. Ainda não há regionalização, mas na política e no exercício da administração do Estado, Évora já é quem mais ordena!
Sem qualquer provincianismo bacoco, a verdade é que as expressões de protesto contra este episódio do Intercidades revelam uma atitude adequada, concreta e capaz de mostrar que esta região está farta de continuar em silêncio perante as maldades que lhe fazem.
Um diplomata brasileiro afirmou que “quem não luta pelos seus direitos não é digno deles”. E neste caso dos comboios, parece estar criado um ponto de partida para que os baixo-alentejanos deixem de “comer e calar”!  É horrível continuarmos a ser este povo tão conformado e apático. Por isso, saudamos quem impulsionou este movimento de contestação e temos esperança que os partidos não cedam à tentação de anular este ponto de partida. Neste como noutros problemas, Beja precisa da energia dos cidadãos para reassumir o seu estatuto de capital.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

um novo tempo



Hoje, terça-feira, 25 de Janeiro, a Rádio Castrense completa 24 anos de vida! A par do Museu da Lucerna e dos grupos corais “As Camponesas”, “Os Carapinhas” e “As Ceifeiras” de Entradas, a rádio integra a Cortiçol.

Sucede que, nesta data simbólica, vai decorrer a tomada de posse dos órgãos sociais da Cortiçol – Cooperativa de Informação e Cultura de Castro Verde. Com um conjunto de pessoas que considero e estimo muito, assumirei a presidência da direcção, acompanhado pelo Carlos Vitoriano (Tesoureiro) e pelo Napoleão Mira (Secretário). O José Tomé lidera a Assembleia-Geral e o António Sebastião é o presidente do Conselho Fiscal.

Quisemos avançar para um projecto de ruptura com o passado recente. Para isso, apresentámos a candidatura “Um Novo Tempo”, com um programa concreto mas muito ciente das dificuldades.
Um dos propósitos que temos é abrir as portas da cooperativa! A Cortiçol será, a partir de hoje, uma casa mais próxima dos seus cooperantes, colaboradores e cidadãos do concelho de Castro Verde que queiram interessar-se e partilhar a sua actividade.
Por isso, divulgo aqui a motivação geral que preside a este  projecto, que foi sufragado pelos cooperantes da Cortiçol numa das maiores assembleias-gerais dos últimos 15 anos:

UM NOVO TEMPO

Nos últimos anos, por razões diversas que não devem ser omitidas nesta fase, a Cortiçol remeteu-se a uma gestão casuística, sem visão integrada nem objectivos estratégicos.
Fizeram-se coisas boas! Mas fez-se pouco.
Neste enquadramento, a candidatura que agora apresentamos aos corpos sociais da Cortiçol é orientada por dois princípios elementares: reorganizar a cooperativa, assumir o seu grande potencial.

REORGANIZAR A COOPERATIVA
é a tarefa mais urgente porque, nos seus diferentes departamentos, emergiram fragilidades que tiveram preocupantes consequências no seu bom desempenho.

Precisamos de corrigir o que não está bem e criar uma estrutura mais profissional, que não abdique do rigor, para atingir objectivos muito concretos. Essa estrutura deve saber traduzir no terreno, com melhor competência e determinação, as deliberações tomadas pelo elenco directivo.
À equipa da Direcção caberá sobretudo definir as estratégias, programar as acções e o seu financiamento. E determinar a sua boa execução a partir de um novo organigrama criado no âmbito do actual quadro de pessoal.
Não é uma tarefa fácil! Porventura, parte significativa do primeiro ano do mandato será consumida com estas tarefas que, além de sanarem problemas latentes, serão o ponto de partida para um período novo.

ASSUMIR O GRANDE POTENCIAL
da Cortiçol porque, nestes quase 25 anos de serviço público, foi possível consolidar uma “marca” que pode e deve ser ajustada a novas realidades.

Basicamente acreditamos que é possível acentuar o conjunto de actividades que estão na origem e na alma da cooperativa, mas devemos fazê-lo com um novo modelo de gestão e uma dinâmica que não tenha pudor em assumir princípios empresariais.
Esse é o ponto de partida para solucionar problemas de financiamento: ter receitas próprias diminuirá os riscos de dependências e criará boas condições para potenciar melhor os nossos projectos.
Respeitaremos com rigor os princípios que estiveram na matriz fundadora da Cortiçol. E, ao mesmo tempo, saberemos tirar partido de ideias e projectos de anteriores equipas directivas, criando sinergias internas que engrandeçam a acção e acentuem a pluralidade da Cortiçol.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

sem surpresa


Sem surpresa! Cavaco Silva ganhou, perdeu perto de 500 mil votos e teve a reeleição menos votada da história da democracia, fez um discurso de vitória decepcionante (para não dizer outra coisa!) e vai ficar mais cinco anos na Presidência. Sem surpresa! Manuel Alegre fixou-se nos 20%, pagando a factura dos desalinhamentos continuados com o PS, provando que os votos não são propriedade de ninguém, sofrendo na pele aquilo que há cinco anos provocou a outros. Sem surpresa! Fernando Nobre teve um resultado muito digno, atestando que a cidadania está a fazer caminho, dando provas que a sociedade civil está um bocado farta (mas ainda pouco!) das imensas máquinas partidárias. Sem surpresa! O prémio para a graça e a ironia desconcertante de José Manuel Coelho, que mostrou um estilo desalinhado, pobre mas frontal, que divertiu as pessoas e lhes abriu a porta para ridicularizarem a política e os políticos. Sem surpresa! O desfecho menos que residual de Defensor Moura, que tinha feito muito melhor se estivesse sossegado.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

a caminho

uma boa causa


Vivemos num quadro de crescente envelhecimento da população, mas também de fragilidades em muitas famílias desprotegidas.
Neste contexto, cabe ao Estado desempenhar um papel mais activo, com respostas concretas e céleres, dadas a partir de um permanente diagnóstico da realidade. O Estado não pode ignorar, distrair-se ou alegar desconhecimento. E é intolerável que, por razões economicistas ou de mera contabilidade demográfica, continue a apresentar a sua demissão em muitos processos.
Percebemos muito bem que, na sua imensa máquina, a Segurança Social nem sempre tem a possibilidade de dar respostas atempadas e eficazes. Por isso, parece natural a consolidação gradual de cooperação com instituições particulares de solidariedade social (IPSS). E é neste contexto de parcerias público-privadas que temos de fazer ainda mais trabalho!
Criadas, normalmente, a partir das comunidades locais, as IPSS são conhecedoras privilegiadas do meio e, por isso, têm competência para fazer melhores diagnósticos e agir com respostas concretas e bem estruturadas.
Percebe-se que a economia social é um sector em crescimento e com extenso caminho para percorrer. Contudo, insistimos que os diferentes poderes públicos, incluindo as autarquias locais, não podem acomodar-se em posições de mera observação.
Aquilo que parece urgente é, cada vez mais, uma genuína cooperação, que elimine visões de natureza política e valorize o interesse público comum. Por outro lado, esta responsabilidade não pode ter apenas respostas institucionais. É necessário que haja na sociedade civil uma assumpção de responsabilidades mais concreta.
As pessoas, para quem, em primeira instância, são criadas respostas sociais, não podem ser as primeiras a encolher os ombros e demitir-se sem remorsos do seu procedimento. Como exigir ao Estado se não damos um pouco do nosso tempo ao bem comum?
Esta é a questão pertinente, sobre a qual devemos reflectir num tempo de excessivas fragilidades e problemas cada vez mais dolorosos no horizonte. E não julguemos que nos damos bem com o mal dos outros porque, quando menos esperamos, bate-nos à porta a necessidade urgente da solidariedade. É bom que tenhamos consciência disso!

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

brilham-nos os olhos


Podias ser o homem mais assertivo mas eras, ao mesmo tempo, um homem muito dócil. E eras tolerante, sensível e companheiro de todos os companheiros que te quisessem compreender e aceitar assim.

Temos saudades de ti.

Saudades da solidão intrigante que só a alguns revelavas. De te ver rasgar o empedrado das ruas da vila na velha motorizada, com a faca de mato, os binóculos e a máquina fotográfica a tiracolo. Vinhas do campo, com quem partilhavas segredos e sensibilidades. Onde simplesmente soltavas a aventura que tinhas dentro no peito, com gritos que cortavam a áurea do amanhecer e nos faziam sorrir. Ainda nos fazem sorrir!

Brilham-nos os olhos quando lamentamos a tua inesperada partida e recapitulamos o mistério das tuas decisões. Brilha-nos a alma quando nos fixamos nos instantes do teu olhar delicado, postos no papel em fotografias que exaltam as paixões que tinhas pela imensa terra que nos cerca e por tudo o que com ela convive.

Temos saudades de ti.

Mas voltaremos todos a encontrar-nos numa fotografia tirada à porta do céu. E beberemos, depois, todo o vinho tinto que nos apetecer, entre conversas sérias ou simples provocações, que te farão rir ou ser muito brusco, na exacta proporção que cimentou as nossas amizades.

Espera por nós.


Texto dedicado ao Zé Manel (2005)

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

um herói em São Marcos


No início da década de Noventa era a grande coqueluche do Estádio de São Luís em Faro. Hoje, Manoel Inácio da Silva Filho, 48 anos, encanta o público alentejano com o seu futebol “rendilhado”, num porte elegante e vigoroso que pede meças aos mais jovens.
No mundo da bola, Manoel Filho ficou célebre como Pitico, jogador dos tempos áureos do Sporting Farense e actual “estrela” do FC São Marcos da Atabueira, Castro Verde, emblema que disputa a 1ª divisão distrital da Associação de Futebol de Beja.
Sempre solidário, interveniente, capaz de conceder uma palavra de conforto ou “disparar” um reparo mais incisivo, Pitico é o comandante da equipa e sabe usar a sua influência. Um estatuto que lhe é concedido pela carreira muito “calejada”, que continua a prolongar-se em terras alentejanas.
Tudo começou há cinco anos, quando um amigo o convidou para jogar em São Marcos. Pitico aceitou e começou a mostrar nos campos do distrital bejense que ainda continua em grande forma, apesar do trabalho o deixar treinar “poucas vezes”. “O segredo é ter uma vida regrada e evitar a noite. Sempre fui assim, muito ligado à minha família”, explicou.
No Alentejo, o jogador enaltece “os sentimentos de amizade e camaradagem” que o prendem à aldeia. Por isso regressa, todos os domingos, com outros companheiros algarvios. “Alguns pensam que andamos aqui a ganhar muito dinheiro. Talvez não percebam o valor da amizade”, remata em jeito de confidência, à porta do petisco com os companheiros e a “directoria”.
Longe vão os tempos com a camisola do Central de Caruaru, onde despontou em 1986. “Depois de Péle e Zico… temos Pitico”, anunciava em letras garrafais um jornal brasileiro, prevendo uma carreira auspiciosa ao rapaz de Caxias do Sul, na zona de Porto Alegre.
Sob as ordens de Emerson Leão, mudou-se para o Sport Recife, onde ganhou o título brasileiro de 1987. Mas Pitico tinha o sonho de jogar numa equipa de São Paulo. O objectivo foi concretizado quando o mesmo Emerson Leão trocou de emblema e quis levá-lo consigo. “Fomos campeões e ele me levou para o São José”.
O encanto da cidade cosmopolita durou apenas quatro meses. Debaixo do olho do Sporting, que optou por Marlon Brandão, o jovem extremo foi também observado por José Augusto, antigo “Magriço” e estrela do Benfica, na altura treinador do Farense. “Ele foi o grande responsável pela minha vinda para o Farense. Foi um dos grandes treinadores que tive e tenho uma amizade fora de série com ele”.
Pitico chegou a Faro rotulado de craque. Durante sete anos, foi a grande estrela de uma equipa recheada de bons jogadores, que atingiu as competições europeias e a final da Taça de Portugal. O seu futebol encantou emblemas mais poderosos e o brasileiro Marinho Peres insistiu em levá-lo para Alvalade. No último momento, a massa associativa algarvia fez pressão sobre a “directoria” do Farense e o negócio falhou. “O presidente [do Sporting] era Sousa Cintra e já tínhamos tudo acertado, mas no Farense as pessoas diziam que era impossível sair do clube. Não tinham como explicar a saída”.
O número 20 do FC São Marcos não esconde a mágoa com essa oportunidade perdida. Admite que foi falta de sorte e que perdeu muito dinheiro: “Deixei de evoluir como jogador e perdi muitos ganhos financeiros. Para te falar a verdade a vantagem [financeira] era abismal de mais”, confessou.
Benfica e Vitória de Setúbal também o “namoraram”, mas a transferência nunca se concretizou. Só em 1994, com nove meses de ordenados em atraso, entrou em ruptura com a direcção algarvia e mudou-se para o Beira-Mar, que recorda como “uma clube inesquecível”.
Dois anos depois voltou ao Algarve para ser jogador e treinador do Imortal de Albufeira. A experiência não durou muito tempo e o empresário Fernando Barata convidou-o para director desportivo. As coisas não correram bem e Pitico justifica-se afirmando que “estar fora da noite não ajudou nada”. “No Algarve, para conseguir um emprego como treinador é preciso estar na noite porque as pessoas estão na noite. Eu, como não tenho esse feitio, não vou ser treinador nunca”.

Publicado no "DN" (2007)

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

a caminho

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

loja grande



A Loja Grande foi um local emblemático da vila de Entradas, cuja fundação se estima ter sucedido no século XIX. Embora não haja uma data conhecida que assinale a sua inauguração, sabe-se que em 1869 já tinha as portas abertas, pois foi nessa altura que João de Brito Palma ali começou a trabalhar, com apenas 13 anos de idade, tendo-a adquirido ao então proprietário e seu padrinho, Manuel Amador, provavelmente em 1878.
Para todos os efeitos a Loja Grande era o mais importante estabelecimento comercial da época e o barómetro económico da vila. Situada ao fundo da Rua do Paço, junto à actual Praça Zeca Afonso [residência actual dos irmãos Sales de Brito Palma], era gerida por um cunhado do dono, Joaquim Revez Duarte, e vendia mercearias, fazendas, louças, vidros, materiais de construção, cereais, artigos funerários e de drogaria, alfaias agrícolas, adubos, ferragens, sola e chapéus.
A generalização do comércio é tão grande que a loja chega a ser armazenista de cervejas e pioneira na região no negócio dos seguros para o sector agrícola.
Segundo exprime o registo contabilístico do estabelecimento, os apuros na gaveta eram consideráveis. Em 1903, ou 04, João de Brito Palma matava num só dia uns 10 porcos que vendia na totalidade ao balcão.
Nos anos 20, em meados de Agosto, por altura da Santa Maria, conhecido como dia dos almocreves e data tradicional para se pagarem rendas e fazerem contas, a loja tinha uma receita diária na ordem dos 15 a 20 contos (hoje, cerca de 75 a 100 euros).
Este número, há 85 anos, representa um volume de negócios extraordinário e, naturalmente, dá a conhecer uma situação financeira “confortável” dos moradores da freguesia e arredores, principais clientes do estabelecimento, que é um verdadeiro “hipermercado” desse tempo, chegando a ser considerado “o maior do concelho de Castro Verde”.
Para se entender verdadeiramente os valores que estamos a falar, vale a pena referir que em 1927 o orçamento anual da Junta de Freguesia de Entradas não passava dos 734$03. E em 1928 atinge um pouco mais: 767$55 (um pouco menos de quatro euros!).

Extracto do livro "Entradas - A Sociedade e a Vila" (2005)